quinta-feira, 27 de março de 2008

Dossier 3º Período: Epistemologia de Popper

Karl Popper- filósofo(epistemólogo) austríaco ( 1902- 1994)

Popper e a Crítica à concepção clássica de Ciência

(págs. 180-195 do Manual)

A Crítica à Indução:
Tal como se verificou em David Hume, Popper vai analisar os fundamentos lógicos do procedimento indutivo concluindo que, por maior que seja o número de observações empíricas particulares, não existe qualquer justificação racional para se proceder à sua generalização a todos os casos. Mesmo que se tenham observado milhares de cisnes brancos, nada nos autoriza a inferir que “todos os cisnes são brancos” pois, bastará uma única observação contrária, para refutar essa convicção inicial enraizada na experiência. Assim, as inferências indutivas não conferem ao conhecimento nem necessidade lógica nem validade universal pelo que, na óptica deste autor, a ciência tem o seu ponto de partida crucial, na formulação de hipóteses: num processo puramente racional, autónomo face à experiência; a ciência não é mais do que um conhecimento conjectural.

O Racionalismo Crítico de Popper: Desenvolvimento e Progresso
A objectividade científica é sempre aproximada : a verdade é sempre relativa a um determinado estado do desenvolvimento científico; não há métodos concludentes e uma das características fundamentais do conhecimento científico é a sua revisibilidade.
Popper procura responder à crise de objectividade que atravessa a ciência, defendendo que o importante não é verificar ou demonstrar a veracidade das hipóteses. O cientista, na sua óptica, deve ter uma nova atitude e essa consiste em considerar que não há certezas inabaláveis/indestrutíveis. O espírito científico é anti-dogmático por natureza e isso pressupõe toda a abertura possível à discussão, à descoberta de erros e inconsistências nas teorias, à assunção plena das incertezas: por isso, a procura da verdade não se faz, (como tradicionalmente se pensava na ciência clássica), pela verificação das hipóteses e teorias, mas pela sua falsificação - o que implica a descoberta de erros e corroboração - que implica a sua resistência aos testes, isto é, quando, após realizados, não foi demonstrada a sua falsidade. Na perspectiva deste epistemólogo, a verificação por testes só serve para corroborar ou falsificar as teorias: a ciência é uma reconstrução racional permanente na qual as teorias são como “redes” que o cientista lança para “capturar o mundo”: racionalizá-lo, compreendê-lo e dominá-lo. As teorias são, por isso, conjecturas (especulações do espírito criativo da ciência) que devem ser constantemente postas à prova. Uma teoria corroborada é aquela que que resiste às refutações depois de ter sido intensamente testada, o que não significa que as verificações sejam concludentes/definitivas/conclusivas; se assim fosse, não existiria PROGRESSO e este é uma das marcas distintivas da ciência. A ciência só avança na medida em que põe em causa conhecimentos anteriormente adquiridos e nisso consiste o ideal da refutabilidade.
Não há, por isso, acumulação de conhecimentos ; as novas teorias são aceites quando permitem explicar melhor um maior número de problemas: o erro deve ser assumido como um factor dinâmico de PROGRESSO e não como factor alheio à ciência, ou que contribua para a sua estagnação. A estagnação é própria dos espíritos autoritários e dogmáticos e todo o verdadeiro cientista é aquele que assume que a verdade é o limite inalcançável para onde caminha toda a investigação.

Dossier 3º Período - Ciência e Futuro: manipulação genética

Sórdida? Chocante? Repugnante? Quero que fique bem claro que a imagem, como « caricatura» de um futuro possível, não pretende alarmar, mas tão só, exortar-nos à reflexão.

Riscos e Maravilhas da Ciência : « aprendizes de Feiticeiros?»
Programa de Filosofia: Opção B: A Manipulação Genética

"Nada contra a clonagem, tudo a favor de uma Ciência responsável"
A ideia de clonagem surgiu em 1938 quando Hans Spermann, embriologista alemão (Nobel de Medicina, 1935) propôs uma experiência que consistia em transferir o núcleo de uma célula em estágio tardio de desenvolvimento para um óvulo. Em 1952, Robert Briggs e Thomas King, de Filadélfia, realizam a primeira clonagem de sapos a partir de células embrionárias. Em 1984, Steen Willadsen da Universidade de Cambridge clonou uma ovelha a partir de células embrionárias jovens. Um grupo de pesquisadores da Universidade de Wisconsin clonou uma vaca a partir de células embrionárias jovens do mesmo animal (1986). Em 1995, Ian Wilmut e Keith Campbell, da estação de reprodução animal na Escócia, partiram de células embrionárias de 9 dias para clonar duas ovelhas idênticas chamadas de "Megan" e "Morag". No ano seguinte surgiu "Dolly", “clonada” pelas mãos destes mesmos pesquisadores a partir de células congeladas de uma ovelha. Esta foi a grande inovação - e que criou a grande repercussão do caso-, um clone originado não de uma célula embrionária, mas sim de uma célula mamária. Em 1997, Dolly teria seu nascimento anunciado, sendo o marco de uma nova era biotecnológica.
A palavra clone foi criada em Biologia para designar indivíduos que se originam de outros por reprodução assexuada. A clonagem, que é o nome que se dá à formação de clones, é o meio de reprodução mais frequente e natural dos vegetais inferiores, mas as plantas superiores também se podem multiplicar desse modo, como é o caso da grama dos jardins, que geram plantas independentes ao formarem raízes nos nós dos ramos laterais junto à terra. Às vezes, como acontece com a bananeira e, geralmente, com a parreira e com a cana de açúcar, a clonagem é o único meio de multiplicação de uma planta. Quando um jardineiro obtém mudas de begónia a partir de uma folha ou usa estacas cortadas dos ramos de uma roseira, para conseguir mudas plantadas ou enxertadas,está praticando clonagem. Aliás, foi dessa prática que surgiu o termo clone porque, em grego, klón significa estaca.
A clonagem também ocorre naturalmente em animais, inclusive na espécie humana. De facto, em todas as populações humanas, tem-se que, de cada mil nascimentos, em média, quatro são de pares de gémeos denominados univitelinos ou monozigóticos, porque se originam de um único ovo ou zigoto. Assim, em vez de o zigoto originar um único indivíduo, tem-se que, nos primeiros estágios do desenvolvimento embrionário, entre um e 14 dias após a formação do zigoto, ocorre uma subdivisão que dá origem a dois indivíduos. Essa subdivisão é, pois, uma reprodução assexuada. Por terem essa origem, os gémeos monozigóticos são, indiscutivelmente, clones e, regra geral, geneticamente idênticos.
É essa identidade que faz com que os gémeos monozigóticos sejam do mesmo sexo, isto é, pares do sexo masculino ou do sexo feminino. O nascimento de trigémeos monozigóticos é bem menos frequente e mais raramente ainda, nascem tetragémeos ou quíntuplos monozigóticos. Esses clones humanos naturais não devem, entretanto, ser confundidos com os gémeos que resultam de poliovulação e que, por isso, não são necessariamente concordantes quanto ao sexo e podem ser dizigóticos, trizigóticos, tetrazigóticos etc., conforme se originem de dois, três, quatro etc. zigotos distintos.
Os gémeos monozigóticos têm, regra geral, o mesmo património genético (genótipo); porém, durante qualquer reprodução assexuada pode ocorrer alguma alteração do material genético (mutação), resultando um ser com genótipo um pouco diferente daquele que está presente no ser original. Mas, na ausência de mutação, os gémeos monozigóticos, do mesmo modo que outros clones, são geneticamente idênticos. Essa identidade genética, entretanto, não significa identidade na aparência física ou psicológica, porque todo o ser vivo é o resultado da interação da sua constituição genética com o ambiente e é por isso que os gémeos monozigóticos têm aparência física semelhante, mas não são fisicamente idênticos, além do que, eles apresentam individualidade psicológica. Parece interessante insistir nesse detalhe porque, lamentavelmente, existe uma tendência generalizada de enfatizar apenas a importância da constituição genética das pessoas e de menosprezar o efeito do ambiente, como se o ser humano não fosse mais do que o seu genótipo! Tudo na sociedade humana, inclusive a criminalidade ou o uso de drogas, é apresentado pelos meios de comunicação como consequência de um destino genético, talvez para que muitos sejam levados a crer que os governos não podem ser responsabilizados pela "falta de sorte" de uma parte de sua população.
Do exposto, pode-se concluir que, no início de 1997, os meios de comunicação denominaram incorretamente de clone à famosa ovelha Dolly, porque ela resultou da união de um ovócito de uma ovelha de cor escura, do qual foi retirado o núcleo (ovócito enucleado), com uma célula da teta de uma ovelha branca. Em outras palavras, a ovelha Dolly herdou da ovelha branca o material genético nuclear, isto é, o DNA contido nos cromossomas do núcleo da célula da teta, e herdou da ovelha escura o material genético citoplasmático, isto é, o DNA contido em organelas denominadas mitocôndrios. Para gerar a ovelha Dolly alcançou-se, assim, o feito espectacular de fazer com que os genes nucleares de uma célula diferenciada originária da teta da ovelha branca passassem a funcionar como os de uma célula indiferenciada, isto é, como aquelas do início do desenvolvimento embrionário.
Visto que para gerar a ovelha Dolly foi essencial a contribuição de uma célula sexual feminina (ovócito), essa ovelha não deveria ter sido chamada de clone. Mas quem pode com os meios de comunicação, que também inventaram a designação estapafúrdia de "bebé proveta"? Foi, pois, assim, que a técnica empregada para produzir a ovelha Dolly, depois empregada com pequenas variações para outros mamíferos, inclusive, recentemente, para o ser humano, passou a ser conhecida como clonagem e passaram a ser chamados de clones todos animais ou embriões produzidos por essa técnica.
Se eu tivesse que dar um nome para essa técnica eu diria que ela é apenas mais uma dentre as diferentes técnicas de fertilização assistida, que procura unir uma célula sexual feminina enucleada com uma célula somática, isto é, uma célula não-sexual. A meu ver, a única e grande restrição que deve ser feita, no momento, à aplicação dessa técnica à espécie humana reside no fato de que, até agora, os resultados conseguidos com ela em outros mamíferos ainda estão longe de serem considerados bons. De facto, o seu rendimento é baixo, isto é, a razão entre os ovócitos necessários e os conceptos resultantes é muito alta, além do que, é alta a proporção dos conceptos gerados por essa técnica que apresentam anomalias congénitas, ou que resultam em óbito neonatal por problemas respiratórios e circulatórios ou, ainda, que apresentam peso excessivamente alto associado a aumento do volume placentário.
Entretanto, assim que essa técnica estiver bem padronizada não vejo razões para que, em situações especiais, ela não possa ser aplicada à espécie humana, pois terá uma vantagem sobre a técnica de fertilização assistida que, em casos de esterilidade masculina, emprega doadores de espermatozóides. Visto que esses doadores permanecem no anonimato, sempre existirá o risco de pessoas geradas por um mesmo doador virem a se casar sem saber que são meio-irmãos pondo, assim, sua prole em grande risco de nascimento com anomalias resultantes da consanguinidade próxima. Evidentemente, as pessoas que se candidatarem a esse tipo de reprodução deverão estar sempre conscientes dos riscos de ocorrência de mutações indesejáveis na célula somática usada na união com o ovócito enucleado.
Considero que essa técnica de reprodução assistida, apesar de não estar bem estabelecida, está longe de ser considerada como uma ameaça à humanidade, como ela é apresentada em um número exorbitante de artigos, entrevistas, pesquisa de opinião nos meios de divulgação de todo mundo. De facto, em que consistiria essa ameaça? Evidentemente, se esse tipo de reprodução fosse realizado em grande escala, está claro que a homogeneidade resultante poderia ser prejudicial. Num clone, quando um indivíduo é susceptível a um microrganismo causador de uma doença, ter-se-á que, regra geral, todos os elementos do clone apresentarão a mesma susceptibilidade. Se a doença for letal, todos serão dizimados, com excepção dos que, eventualmente, forem portadores de uma mutação que confira resistência a esse microrganismo.
Esse risco de homogeneidade, entretanto, não existirá, na espécie humana, porque a maioria dos indivíduos de nossa espécie prefere o método clássico e agradável de reprodução, empregado desde os tempos imemoriais, que requer um homem e uma mulher. Portanto, os casos excepcionais dessa reprodução assistida, que tem sido chamada de clonagem, não poderiam afectar a estrutura genética das populações humanas de modo a ter um efeito significativo.


Sugestão para quem quiser saber mais:
O estudo de gémeos Livro de Bernardo Beiguelman(1) sobre a biologia da generalidade e da reprodução humana. Disponível gratuitamente, em formato PDF

Impedir o emprego dessa técnica por causa do risco remotíssimo de sua utilização para a criação de uma sociedade homogénea facilmente manipulável não faz o menor sentido, porque já foi demonstrado à saciedade que a manipulação de populações humanas não exige identidade genética. Mais do que a improvável homogeneidade genética, devemos temer o ambiente homogéneo dos regimes totalitários, que conduzem ao fanatismo e ao ódio.

(1)Bernardo Beiguelman é Professor Titular da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP (Aposentado) e Professor Titular Visitante do Instituto de Ciências Biomédicas da USP

Posteriormente à ovelha mais famosa do mundo surgiram clones de bezerros, cabras, camundongos, porcos e macaco rhesus. Hoje a corrida tecnológica da clonagem tem como países líderes os Estados Unidos, Escócia, Inglaterra, Japão, Nova Zelândia e Canadá.
Os procedimentos mais utilizados em animais e que começam a ser usados em clonagem de humanos são dois: um deles consiste em utilizar o material genético (núcleo) extraído de uma célula não reprodutiva ou somática (diferente do óvulo ou espermatozóide) de um indivíduo e inseri-lo em um óvulo cujo núcleo com DNA tenha sido retirado. Essa célula pode ser originada de um embrião, feto ou adulto que estejam vivos, mantidos em cultura em um laboratório ou de tecido que esteja congelado.
A outra técnica consiste na fusão de uma célula inteira com um óvulo sem material genético. Foi essa justamente a técnica utilizada em Dolly. A fase crítica - em que esta experiência pode não resultar, dá-se na etapa de fusão das células, feita através de corrente eléctrica ou com um vírus chamado Sendai.
Breve descrição do processo:
1) As células somáticas são retiradas do doador 2) Essas células são cultivadas em laboratório 3) De uma doadora colhe-se um óvulo não fertilizado 4) O núcleo contendo DNA é retirado do óvulo 5) A célula cultivada é fundida ao óvulo por meio de corrente eléctrica 6) Agora temos o óvulo fertilizado com nova informação genética 7) Este óvulo vai se desenvolver até a fase de blástula (embrião com mais de 100 células) onde estão as células tronco.

Mas existe também a possibilidade de animais serem clonados para fins terapêuticos, servindo para a experimentação ou visando a produção de órgãos compatíveis com o ser humano - animais poderiam ser, um dia, produzidos em série para transplantes. Algumas empresas, como a Advanced Cell Technology (ACT), a mesma que alegou ter clonado o primeiro embrião humano da história, já dispõe de um banco de tecidos para quem quiser guardar amostras de seu bichinho de estimação ou de animais com grande potencial pecuário. Quando a técnica de clonagem estiver bem estabelecida esse material poderia ser utilizado.
O Missyplicity Project reúne cientistas que estão tentando clonar a cadela Missy (foto). O Genetic Savings & Clone é um banco de DNA criado especialmente para animais.
A ideia de produzir clones de animais de estimação por enquanto só é possível em filmes como O Sexto Dia, estrelado por Arnold Schwarzenegger. Na história, o cachorro do personagem de Schwarzenegger é clonado por uma empresa chamada Re-pet, especializada em animais de estimação.
No entanto, bancos como esses começam a ser formados também para animais em extinção como o Centro de Reprodução de Espécies em Extinção do Zoológico de São Diego (EUA) e o Centro para Pesquisa de Espécies em Extinção do Instituto Audubon (EUA). A ideia é que, no futuro, o material genético de animais ameaçados de desaparecer possa ser usado para cloná-los e reproduzi-los.
A ACT chegou a clonar, em 2000, um gauro, espécie em extinção semelhante ao boi, natural da Índia, Indoshina e parte da Ásia. O animal fora clonado a partir de células da pele de um gauro fundidas com óvulos de vacas. Mas após nove meses de gestação o animal morreu, pouco depois de nascer, devido a complicações no sistema respiratório.
A expectativa é que a clonagem seja a única alternativa para recuperar espécies já extintas como o tigre da Tasmânia (desaparecido desde 1930) e o bode bucardo da montanha (desaparecido desde 2000). Existe, porém, a preocupação para que o material armazenado desses animais tenha variabilidade genética para que não sejam originadas populações tão homogéneas que correriam o risco de serem dizimadas por vírus e bactérias. O armazenamento de amostras de células do maior número de animais de uma espécie que ainda estejam disponíveis no mundo, poderia garantir indivíduos com menor igualdade genética.

Nota: Actualmente, ainda não é possível utilizar DNA extraído de organismos preservados em âmbar (como sugere o filme de Steven Spielberg O Parque dos Dinossauros), de células congeladas em condições diferentes às exigidas por condições laboratoriais, células de cadáveres ou de material fossilizado.